Ex-Rádio Globo expõe bastidores na direção em mudança de público: “foi um erro”

Os bastidores envolvendo os últimos anos da Rádio Globo sempre chamam a atenção do público e do mercado. Recentemente, o empresário Fernando Morgado, ex-Globo e muito conhecido por assinar uma das biografias de Silvio Santos (1930-2024), contou detalhes do que viu internamente na mudança de público da emissora.

“Vivi às vésperas [processo de mudança de público Rádio Globo]… Quero deixar bem claro que eu não trabalhei nesse processo de mudança. Como dizem: ‘me inclua fora dessa’. Eu trabalhei no Sistema Globo de Rádio, na Inteligência de Mercado, no Planejamento Estratégico e no Comitê de Programação da Rádio Globo, que existia de 2010 a 2016. Pedi demissão de maio para junho de 2016. A nova Rádio Globo [primeira mudança] entra em junho de 2017. A gente trabalhava na Rua do Russel e eu ficava no sexto andar, que era o andar da diretoria e era o andar acarpetado… Não participei desse processo, mas ouvi muita coisa e vi coisas acontecendo”, disse, primeiramente, ao Sobretudo Podcast, de Aline Bordalo e Alexandre Araújo.

O processo de restruturação da Rádio Globo, ocorrida em 2015, foi a maior mexida da história do Sistema Globo de Rádio. No Rio, a situação comercial da emissora era satisfatória. Entretanto, em São Paulo e Belo Horizonte a situação era complicada.

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“Na época, tinha uma outra direção, que era com o Bruno Thys e o Cláudio [Henriques]… O projeto da Rádio Globo seguia, dentro do seu formato tradicional, com algumas mudanças, na época a gente via muito a busca por mais conteúdo local, a rádio estava ficando mais competitiva. No segundo semestre de 2015, sai o Bruno Thys e entra o Marcelo Soares, que na época era diretor da Som Livre, pertencido então ao Grupo Globo… O Marcelo decide fazer, ele meio que chega com esse dever de casa: reestruturar a Rádio Globo.

Só que existem maneiras e maneiras de você reestruturar. A Rádio Globo é imensa e mesmo com a concorrência forte da Rádio Tupi, ela era absoluta do horário nobre, de manhã, competia ali no esporte… O que poderia ter sido feito ali? Talvez uma ajuste de custos, uma mudança pontual na programação, enfim. O ponto central da Rádio Globo, isso eu via ali, a Rádio Globo do Rio era lucrativa. O problema era São Paulo, porque era só AM, aplicabilidade comercial era menor, e Belo Horizonte, que ali era o AM, com enorme dificuldade pra ser ouvido, e com a concorrência da Itatiaia…”, contou, em seguida.

Rádio Globo mirou na concorrência e na TV para oferecer novo conteúdo, conta Morgado

Além dos problemas nas filiais, a Rádio Globo, segundo Morgado, começava a desenhar uma nova forma de produzir conteúdo baseada em uma concorrente e emissoras do Grupo Globo.

“O grande ponto era: talvez aumentar a margem de lucro da Rádio Globo, resolver São Paulo, resolver BH e você resolvia a Rádio Globo. Só que qual foi o raciocínio que essa direção quis? ‘Vamos modernizar a Rádio Globo’… O pensamento dessa nova direção, não só o Marcelo Soares, mas outro diretor, Júlio Pedro, ele traz: ‘vamos rejuvenescer’… Isso eu não participei, mas não ouvi. Pegando referências da TV e também me lembro de ouvir da direção: ‘minha filha ouve Mix [FM]’, então o caminho também é por aí. Então, era um misto de tentativa de chegar perto da Mix FM… Nada haver. É uma rádio ótima, mas para o público dela. E referências da TV e tinham duas: a TV Globo e o GNT.

Se você reparar, o esquema da programação, até muito das pessoas que foram, Leo Jaime, Mônica Martelli, eram pessoas não da TV Globo aberta, eram do GNT. Porque havia gente na gestão do Sistema Globo de Rádio que eram telespectadores do GNT. Só que o GNT é um produto que é o nicho do nicho. Porque ele é um público feminino, mas de alta renda e tem determinado comportamento, se interessa por determinados temas. Não são os temas da Rádio Globo, da dona de casa, do público classe C… Então pegaram uma parte da referência do GNT e uma parte da TV Globo”.

Pesquisas nortearam as mudanças da emissora

Além disso, Fernando Morgado contou sobre a pesquisa feita pela Rádio Globo para tentar mudar seu público. Todavia, ele informou que a área de Inteligência de Mercado, onde trabalhava, não teve acesso ao resultado.

“Na época, saiu na imprensa que isso foi feito em cima de pesquisa. O que eu poso te dizer: eu era da área que cuidava de pesquisa. Nós não participamos, nem eu e nem os meus colegas, da seleção da empresa que fez a pesquisa. A empresa que fez a pesquisa era uma empresa ligada a um amigo do Júlio Pedro…. Mas eu me lembro de me comentarem: ‘o que é que deu na pesquisa?’. ‘Ah, deu na pesquisa o seguinte: de manhã, as pessoas querem conteúdo falado, de tarde, querem música, de noite, querem futebol'”, acrescentou.

“A ideia, que eu também ouvia, era a seguinte: ‘vamos impor’. Isso foi um erro”, avalia Fernando Morgado

Na opinião de Morgado, a direção da Rádio Globo errou ao fazer a leitura da pesquisa: “Só o que eles interpretaram errado, na minha visão, é que não necessariamente tudo isso numa mesma rádio. E daí a questão de ‘ah, vamos pegar na TV aberta, que na TV aberta funciona assim’. Mas cara, TV Globo é um monstro. A TV aberta você tem quatro, cinco players competindo. Rádio você tem 20. O rádio é mais parecido com a TV paga do que com TV aberta nesse sentido…. Resolveram fazer tipo a TV Globo: de manhã é uma coisa, de tarde é uma coisa, de noite é outra. Às vezes, até funciona em rádios de mercados menores… Só que o Rio de Janeiro é a segunda praça do Brasil. Não era pra uma uma Rádio Globo”, considerou.

Fernando Morgado avalia que havia profissionais envolvidos na transição que não tinham conhecimento necessário da área:

“Mas envolvia o desconhecimento de muita gente ali sobre o meio rádio. Foram nessa ideia de povoar de estrelas e aí chega na TV… Você pega as grandes estrelas da TV Globo, na época, tinha uma grande estrela na TV Globo, um grande apresentador, que ganhava, segundo se comentava nos mercado, entre R$ 5 e 7 milhões por mês. Na Rádio Globo, eu me lembro, que as grandes estrelas, duas das grandes, ganhavam R$ 100 mil. Então, como você vai convencer…?”, disse.

Em seguida, demissões assolam a Rádio Globo

Morgado ainda acrescentou: “Não quero evidentemente dizer que as pessoas ali escolhidas foram plano B ou que são ruins, mas a questão é, pelo menos a informação que eu tinha, não foi possível trazer esses pontas de lança porque economicamente não dava. Foram trazendo outros ou que faziam TV Globo ou GNT… A ideia, que eu também ouvia, era a seguinte: ‘vamos impor’. Isso foi um erro. Eu dizia, quando eu ouvia os interlocutores que vinham falar comigo, eu respondia isso. Não ouviram porque não quiseram”, afirmou, primeiramente, até lembrar da série de desligamentos com a mudança de público.

“Esses dois anos, 2017 e 2019, pelos ouvintes, que perderam a opção, mas pelo mercado. Era muita gente empregada. Quando eu entrei no Sistema Globo de Rádio eram mais de 600 pessoas trabalhando. Lamento muito e acredito que é um caso que, a gente trabalha com rádio, tem que ver com atenção, vendo o que foi feito, para que o rádio siga adiante. É importante deixar claro: não é porque esse projeto não deu certo, que o rádio não tem força o que funciona”, disse, por fim.

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